Pular para o conteúdo principal

Sinal de alerta: a teledramaturgia antenada da Globo


FREDERICO MORIARTY – No início de 1979, Daniel Breláz é eleito deputado pelo Parlamento Suíço. O matemático e político helvético se tornou o primeiro parlamentar do mundo a se eleger por um Partido Verde. Ambientalista e sério, Breláz se reelegeu entre 1979 e 2001, quando deixou o cargo legislativo para tornar-se prefeito de Lausanne, na Suíça. Exerceu o cargo por 12 anos. O partido helvético não foi o primeiro “Green Party”. A primazia dos partidos verdes pertence à Tasmânia. Nasceu pra lutar pela preservação da fauna e flora em 1972 – e do demônio, claro.
No ano seguinte, a Nova Zelândia criou o seu próprio PV. Em 1977, lutando contra a energia nuclear, nascia o mais forte partido verde do mundo, o alemão.
O nosso PV surgiu em 1985, juntando parte da velha esquerda e dos intelectuais com descontentes do PT, como Alfredo Sirkis e Fernando Gabeira. Com o passar do tempo, virou um balaio de gatos que inclui empresários, ambientalistas e muita gente de direita, ao contrário do resto do planeta, em que os Verdes são próximos à social-democracia e à esquerda.
O terceiro maior partido no parlamento europeu
Os anos 70 do século passado foram essenciais para a defesa do meio ambiente. Estocolmo, na Suécia sediou em 1972 a primeira Conferência Mundial do Meio Ambiente. Contando com poucos representantes de estado (o Brasil enviou um governador de triste memória, José Sarney) e sem nenhum documento assinado, a reunião teve como principais feitos o de colocar na pauta global a questão ambiental e criar a Pnuma – a Política das Nações Unidas para o Meio Ambiente.
Por meio do Pnuma, nos anos seguintes se organizaram conferências regionais e mundiais do Meio Ambiente. Estabeleceram-se acordos internacionais do clima e reuniram-se milhares de cientistas em todo o planeta para pesquisar, exclusivamente, os impactos gerados pela humanidade ao meio ambiente. Entre estas iniciativas, a Pnuma organizou em 1979, na cidade de Genebra, a Primeira Conferência Mundial do Clima, mesmo ano do deputado verde Daniel Breláz.
E foi exatamente no dia 26 de Janeiro de 1979 que o comendador Tião Borges recebia a justa homenagem (pelos serviços prestados à sociedade), da Assembleia Legislativa do Rio, no último capítulo da novela “Sinal de Alerta”, exibida pela Rede Globo de Televisão entre julho de 1978 e janeiro de 1979.
Escrita por Dias Gomes e dirigida por Walter Avancini, a trama televisiva contava a história de um empresário rico, migrado do Pará para o Rio. Tião Borges (interpretado por Paulo Gracindo, o ex-prefeito da Sucupira da novela “O Bem Amado”) construiu um império com a Fertilit, a sua empresa de fertilizantes.
Os protagonistas Sulamita (Vera Fischer) e Tião (Paulo Gracindo)
De abertura diferente, sem música de fundo, Sinal de Alerta durou 116 capítulos e foi a última novela “das Dez” que passou na Globo. Tião era divorciado de Talita (Yoná Magalhães) e passa boa parte da trama tentando conquistar o coração da jovem filha da tradicional sociedade carioca, Sulamita Montenegro, interpretada pela ex-miss Brasil de 1969, a catarinense Vera Fischer.
A moderna e contestadora abertura da última novela das 10 da Globo
E onde está a novidade? Consuelo (Isabel Ribeiro) e Nilo (Eduardo Conde) começam a se revoltar e a denunciar a poluição ilegal provocada pela Fertilit. Aos poucos, o movimento ganha as ruas. Nilo conhece a professora Selma (Renata Sorrah), se apaixona e larga a esposa – a operária alienada Vera (Bete Mendes). A luta ambiental ganha a batalha, predominando na trama. A Fertilit chega a fechar as portas por decisão judicial.
(Fotos e imagens: Globo Memória)
Dias Gomes nunca deixou de ser irônico em suas obras. Além da condecoração no último capítulo da novela, Tião ganha uma biografia de Rudi (Jardel Filho), personagem claramente inspirado no filme “Terra em Transe”, de Glauber Rocha. Tudo com apoio do jornal “A Folha do Rio”, de propriedade da ex-esposa de Tião, Talita. A trilha sonora nacional conta com várias músicas de temática “verde”, como as do Quarteto em Cy, a de Erasmo Carlos e de Sá e Guarabira. Internacional? Havia um tal de Eric Clapton.
“Sinal de Alerta ” confirma uma velha prática da “Vênus Platinada”, um dos apelidos da Globo, ao mesmo tempo em que o setor de jornalismo tem uma linha editorial ultraconservadora, a ponto de o JN, entre 1968 e 1985, ser um verdadeiro Diário Oficial da Ditadura Militar; o setor de teledramaturgia produzia obras críticas, formadoras de opinião e conectadas com as transformações sociais e culturais mas, claro, sem “ferir” os interesses dos grandes anunciantes.
Sucesso de público e crítica, a censurada Roque Santeiro de Dias Gomes
A arte, como sempre, tendo o importante papel de servir à revolução estética e da alma, e abrir espaço, pela quebra de paradigmas, para que construir uma resistência contra a brutalidade e a opressão do mundo real.
Fãs das novelas, os milhões de brasileiros jamais lerão sequer um livro

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Futebol Total holandês: como a Laranja Mecânica revolucionou o esporte nos anos 70

FREDERICO MORIARTY  – Dirceu parecia Gulliver na terra de Brobdingnag. A personagem de Jonathan Swift deixara Lilliput onde era um gigante em meio à monarquia e agora via-se frente a homens onze vezes maiores. O ponta falso Dirceu vestia a mística camisa da Seleção Brasileira, terra do sobrenatural Pelé e que havia ganhado três das últimas quatro copas. Atordoado em toda a partida, o Brasil desceu o sarrafo na Holanda, país que voltava a disputar uma Copa depois de 36 anos. Os neerlandeses bailavam no gramado alemão como se fosse uma valsa. Mesmo com a vitória fácil, cercavam os pobres tricampeões mundiais. Dirceu, por volta dos 30 minutos do segundo tempo, encontrou-se atacado por 9 adversários. Nunca o mundo do futebol vira algo semelhante. Era o “Futebol Total” holandês na Copa da Alemanha de 1974. Dirceu cercado pelos gigantes holandeses (Foto: Jornal O Globo ) As origens do Carrossel   Holandês Marinus Jacobus Hendrics Michels anotou 127 gols com a camisa do Ajax da H

Quando Pelé e Stallone derrotaram Hitler

FREDERICO MORIARTY  – A primeira impressão que temos do filme é ilusória, afinal a presença de dois canastrões como Sylvester Stallone (no auge do saga Rocky) e Pelé não desmerece a história.  Fuga para a Vitória (Escape to Victory, 1981)  teve a direção do renomado John Huston (o mesmo de  Paixões em fúria,   Freud: além da alma, Uma aventura na África, O pecado de todos nós,  entre outros clássicos) e estavam no elenco os respeitáveis Michael Caine como líder da resistência e Max Von Sydow como o major alemão que tem a ideia da partida de futebol. O roteiro era ambientado na França ocupada pelos nazistas. O major Steiner (Sydow), ex-jogador da seleção alemã, decide realizar um jogo de futebol dos soldados nazistas contra os prisioneiros de guerra. John Colby (Caine) é um capitão inglês que organiza o time dos aliados e mais do que isso, pretendia utilizar o  match  para realizar uma fuga dos atletas-prisioneiros. Colby utilizaria o intervalo da partida para dirigir-se aos s

Laranja Mecânica: o livro de Anthony Burgess, o filme de Kubrick, o futebol holandês e o Brasil Horrorshow atual

FREDERICO MORIARTY  – Johan Cruyff desce pela avenida Marinho Chagas, o então lateral esquerdo do Botafogo, e cruza para Neeskens anotar o primeiro gol neerlandês com 5 minutos de jogo. O Carrossel Holandês começava a passear sobre a poderosíssima seleção brasileira (campeã de três das últimas quatro copas do mundo e terra do maior fenômeno da história do futebol, Pelé). Rinus Mitchell, o técnico dos Países Baixos, utilizara a base do Ajax Amsterdã, então tricampeão invicto da UEFA  (hoje, Xampions  Ligui). A Holanda praticava o revolucionário “futebol total”, no qual os jogadores não tinham posição fixa, ocupavam todos os espaços vazios e atacavam em círculos. Dias antes da partida, o técnico brasileiro, Zagallo, um lambe botas da ditadura militar, que dirigiu a seleção de 70 apenas porque o ditador de então não queria o comunista João Saldanha à frente, proferiu uma de suas tantas empáfias. “Quem tem de estudar e aprender futebol conosco são os holandeses”. Tomamos um var